Voltando ao palácio

Não podia deixar de voltar a ele. Ele domina a paisagem da cidade. Volto a ele e voltarei como se volta a uma peregrinação, carregada de emoção. A primeira vez que lá entrei era noite, uma noite mágica, véspera de São João (La Sant Joan festa maior á Perpinhá) com grande animação nos seus jardins exteriores e interiores. Voltei a ele pouco depois, com o meu amor de adolescência. Havia muito que não voltara a ver aqueles olhos verdes e o meu coração continuava a bater como se o tempo tivesse apagado as cicatrizes da dor que sentira outrora. Deambulamos pelas salas quase vazias dos aposentos do rei, das capelas, da Aula, o corredor íntimo entre os apartamentos reais, as escadas em caracol apertadas escavadas na pedra das capelas. Mas é na parte mais recôndita, lúgubre e escura do palácio- fortaleza, nas masmorras, que nos detivemos a maior parte do tempo. Aqueles espaços recebiam uma exposição de pintura Barroca. Com uma iluminação muito ténua e uma decoração em panos escarlates, as masmorras adquiriram uma atmosfera teatral, transformando-se num palco. Eras tu e era eu, sós, nós os dois, encenando não sei que peça, não sei que personagens... só sei do meu desejo de mergulhar e perder-me no teu mar apagando o fogo de uma noite de São João.